Meu Velho Chico - 12 anos depois
Já se vão 12 anos e três meses que parti para essa aventura extrema de percorrer o rio São Francisco a remo, em canoa canadense, sem apoio terrestre, desde a nascente, aos pés da cachoeira da Casca Danta, na Serra da Canastra, até a foz, em Piaçabuçu, Alagoas... uma façanha da qual me orgulho, não somente pela extensão do rio (cerca de 3.000 km), nem pelas dificuldades enfrentadas e superadas, mas também pelo acolhimento recebido das comunidades quilombolas, indígenas e de ribeirinhos, como também das cidades e vilarejos que visitei, e nelas deixei minha mensagem de esperança e de confiança para nosso POVO tão sofrido...
Infelizmente, não foi assim... os anos que se seguiram trouxeram muito sofrimento e dor aos brasileiros, culminando com essa pandemia que nos apartou dos familiares, amigos e aventureiros, sofrendo a perda de amigos e parentes, de indígenas, quilombolas e ribeirinhos, que sucumbiram à enfermidade, que ainda assola o país devido à negligência daqueles a quem confiamos o poder de governar em nome de todos os brasileiros...hoje, às vésperas de novas eleições, conclamo a todas as pessoas de bem, indistintamente da cor de sua pele, de suas raças, ideologias e crenças, que se unam em torno do bem comum e da salvação dessa Nação Brasileira, tão encantadora quanto o Velho Chico que visitei...
Nesse reencontro de minhas raízes aventureiras, e já avançado na idade a ponto de poder me proteger pela vacinação que já alcançou a minha idade, quero resgatar esses vínculos despedaçados pelo tempo, entre os amantes do Velho Chico e de suas população ribeirinha. Para isso, começo por afirmar que, mesmo não tendo conseguido chegar àqueles que me acolheram para lhes entregar um exemplar de minhas memórias, ainda guardo cada nome daqueles que me deram guarida, alimentação, carinho e dedicação para que eu pudesse compreender a saga desse povo encantado, saber de seus desejos, suas lutas e sua história, ainda que fosse apenas como recortes da plenitude se suas vidas...
Meu propósito era refazer a viagem, desta vez por terra, passando pelas mesmas cidades, povoados, comunidades e aldeias, para reencontrar essa gente maravilhosa e deixar, em cada lugar, um livro dedicado a eles e elas, com minha mensagem de gratidão... porém, foram sete anos de lutas para conseguir publicar o livro de memórias, com apoio de muitos de vocês que hoje me leem... e o tempo é cruel conosco, deixando marcas indeléveis de nossas tristezas, frustrações e sofrimentos, chagas que nunca se curam, mas fazem parte de nossa história de vida e de luta...
Hoje tenho 71 anos... muito daquela energia que tive para percorrer 3.000 quilômetros, grande parte deles remando sozinho, acampando nas margens do Velho Chico, enfrentando ameaças e sendo solidário a toda essa gente encantada que me recebeu como se fosso um dos seus... porém, não desisti dos meus sonhos, e essa é a razão de voltar a esse blog para compartilhar dessa fagulha de esperança de poder terminar o meu trabalho... para cada um de vocês, é apenas um relato de alguém que não conhecem senão pelas minhas narrativas... para outros, um reencontro, mas para mim será o refluir da vida em minhas veias, pois ainda guardo a minha canoa, Ulysses, na casa de um grande amigo, na esperança de poder colocá-la de volta nas águas do Velho Chico, ainda que seja apenas para curtas remadas e breves reencontros... muitos dos que encontrei já se foram, como o pescador Roberto Rocha, de Lagoa da Prata, Minas Gerais, ou a educadora e escritora Joana Comandaroba, de Barra, Bahia...
Porém, o importante é voltar a sonhar... por mais curto que seja esse sonho, não será uma ilusão, mas a grande verdade que aprendi entre vocês, nas franjas do rio, contada por quem deu sua vida a povoar esses lugares mágicos, um caleidoscópio de cenários que ainda povoam minhas memórias... por isso, peço-lhes que compartilhem essa postagem entre os seus entes amados, entre as novas gerações que continuam a habitar as margens do nosso amado Velho Chico...