quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Preservação Estratégica para Recuperar o São Francisco


11 de Abril de 2009

Bacia de um dos principais afluentes do São Francisco, o rio Pandeiros, abriga complexo ambiental pouco conhecido, mas de enorme importância estratégica

Islaine F. P. Azevedo,
Yule R. F. Nunes,
Maria das Dores M. Veloso,
Walter V. Neves e
G. W. Fernandes


A rica diversidade da flora e fauna de Minas Gerais é resultado da grande variedade de condicionantes do clima, relevo, recursos hídricos e presença dos biomas Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga. Uma biodiversidade fundamental para o patrimônio natural, o que justifica a necessidade de preservação.
Mas o processo de ocupação de Minas Gerais, por um modelo de desenvolvimento ligado à utilização intensiva e inadequada dos recursos naturais, comprometeu consideravelmente sua biodiversidade. Áreas naturais do estado sofreram profundas alterações em conseqüência das intensas e contínuas ações antrópicas, algumas delas talvez irreversíveis. Apenas 33% da cobertura vegetal nativa do estado estão preservadas, segundo o Instituto Estadual de Florestas (IEF). E grande parte dessa cobertura vegetal está no norte do estado, confinada em unidades de conservação (UCs).
A área de Proteção Ambiental (Apa) do rio Pandeiros, criada pela Lei 11.901 de 01/09/1995, merece destaque pela ocorrência de ambientes estratégicos para a conservação do patrimônio natural. Com 393.060 hectares, essa área de proteção abrange toda a bacia hidrográfica do rio Pandeiros, incluindo os municípios de Januária, Bonito de Minas e Cônego Marinho. É a maior unidade de conservação de uso sustentável do estado e tem como objetivos compatibilizar a conservação da Natureza com o uso sustentável de parte de seus recursos hídricos, além de proteger a diversidade biológica presente em lagoas marginais, córregos, cachoeiras, veredas e, principalmente, no único pântano mineiro. O rio Pandeiros, que integra a bacia do médio São Francisco é considerado um afluente estratégico na margem esquerda desse rio.
A presença de espécies vegetais comuns ao cerrado e à caatinga caracteriza o local como área de transição, com ocorrência de formações e adaptações particulares. Isso significa, tanto importância biológica como área prioritária para pesquisa científica.
O Atlas de conservação da biodiversidade em Minas Gerais, publicado em 2005 pela Fundação Biodiversitas, classifica a Apa do rio Pandeiros como área prioritária para a conservação da biodiversidade. O norte de Minas, no entanto, é provavelmente a região menos estudada do estado, com parcos levantamentos de flora e fauna. O conhecimento do potencial ecológico das espécies vegetais e animais da região auxilia na manutenção da preservação ambiental dessas espécies, reduzindo assim os riscos de extinção regional, em decorrência de práticas antrópicas predatórias.


Refúgio para a Ictiofauna


O pântano do rio Pandeiros tem área alagável que varia de aproximadamente 3 mil ha (estação seca) a 5 mil ha (estação chuvosa) e é responsável por 70% da reprodução e desenvolvimento de peixes do médio São Francisco.
Nos arredores do pântano, encontra-se um complexo de lagoas marginais, interligadas no período das chuvas, utilizadas como criadouros por espécies de peixes de piracema, que percorrem longas distâncias no São Francisco para a reprodução. Entre essas espécies estão o dourado (Salminus franciscanus), piau-verdadeiro (Leporinus elongatus), matrinchã (Brycon lundii), surubim (Pseudoplatystoma corruscans) e pacu (Myleus micans). O pântano também serve de abrigo e fonte de recursos alimentares para muitas aves, caso do martim-pescador (Ceryle torquatus), pato-do-mato (Cairina moschata), mergulhão- pequeno (Tachybaptus dominicus) e garçabranca- grande (Casmerodius albus).
A importância desse local fez com que, nos limites da Apa, uma área de 6 mil ha se tornasse Refúgio de Vida Silvestre (Revise), como uma categoria de unidade de conservação de proteção integral de ambientes naturais, onde se asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies da flora e da fauna residente ou migratória. O refúgio abriga ainda grande parte das lagoas marginais, cachoeiras, o pântano e a foz do rio Pandeiros, ambientes críticos para a manutenção da ictiofauna do rio São Francisco. Assim, a conservação do rio Pandeiros é fundamental para a revitalização desse rio.
O pântano do rio Pandeiros é considerado ambiente único no estado, e a proteção assegurada pelo refúgio não é suficiente para a sua preservação. Muitos impactos ambientais causados em toda a extensão da Apa estão refletidos no pântano, entre eles o assoreamento, principalmente devido à degradação das veredas e da vegetação ciliar. Esse é um dos mais graves danos ambientais.

Oásis no Polígono das Secas


As águas do Pandeiros e seus afluentes, assim como muitos outros rios do cerrado, são sustentadas principalmente por inúmeras e extensas veredas que representam, na realidade, um oásis em meio à paisagem árida do norte de Minas Gerais, sob a forma de refúgios e corredores naturais da fauna e da flora. As veredas da Apa do Pandeiros são classificadas pela presença de uma palmeira, mais conhecida como buriti (Mauritia flexuosa), e, na maioria das vezes, está associada a espécies arbóreas de mata ciliar e do cerrado, dando a impressão de floresta exuberante. As veredas são legalmente protegidas como Áreas de Proteção Permanente (APP), numa tentativa de conservar um ecossistema frágil e suscetível à degradação.
Em contraste com a rica biodiversidade do local, a população carente do semi-árido mineiro vive em pequenas comunidades rurais, utilizando os recursos naturais da região como forma de subsistência, mas de maneira indevida e não sustentável. A maior parte da degradação ambiental da Apa do rio Pandeiros tem origem em bases sociais. Para os moradores, a extração de lenha do cerrado e transformação das áreas alagadas das veredas em terras de cultura agrícola, com freqüente uso do fogo e de sistemas de drenagem errôneos, é uma estratégia de sobrevivência.
A importância ecológica e a vulnerabilidade da diversidade biológica dos ecossistemas da Apa do rio Pandeiros despertaram as atenções de um grupo de pesquisadores. A intenção é realizar trabalhos científicos no local para desenvolvimento de estratégias de conservação da biodiversidade. Neste sentido, foi montada uma sub-rede de pesquisa “Ecologia, Conservação e Uso Sustentado em Áreas da Transição entre os Biomas da Caatinga e do Cerrado no Médio São Francisco”, englobando grupos de pesquisa da Universidade Estadual dual de Montes Claros (Unimontes), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Universidade Federal de Viçosa (UFV). Esta sub-rede de pesquisa integra o Programa de Revitalização do rio São Francisco e é formada por cinco projetos de pesquisa e um projeto de capacitação, todos na linha de investigação em Conservação e Manejo de Recursos Naturais.
Os projetos têm prazo de dois anos de execução e reúnem cerca de 20 pesquisadores, além de 30 alunos da graduação e pós-graduação das três universidades.
Entre os projetos, a pesquisa na área de fitoindicadores ecológicos para recuperação de matas ciliares no médio São Francisco busca informações sobre as vegetações ciliares do rio Pandeiros, com pesquisa envolvendo as características florísticas, estrutura da comunidade vegetacional e estratégias de reprodução de espécies vegetais. Nessa abordagem, os locais selecionados para amostragem da vegetação ciliar incluem diversas formações vegetacionais como cerrado (sentido restrito), além de veredas e floresta estacional decidual (mata seca) e mata ciliar.


Ambiente Complexo


Os resultados preliminares de um ano de execução do projeto revelam uma vegetação exuberante e intrigante. As formações vegetais que margeiam o curso do rio Pandeiros exibem uma diversidade marcante de ecossistemas provenientes do efeito transicional entre os biomas do cerrado e caatinga e formam uma junção peculiar de mata ciliar, mata seca, cerrado e veredas.
Entre a vegetação encontrada, as matas ciliares, definidas como vegetação florestal associada a cursos d’água e a nascentes, têm uma diversidade de funções ambientais e destacam-se pela rica diversidade botânica e proteção que oferecem à fauna silvestre e aquática. Mas mesmo protegida por lei, a mata ciliar do rio Pandeiros sofre progressivas alterações tornando-se descontinua e, muitas vezes, completamente ausente. As espécies características da mata ciliar ocorrentes nas áreas amostradas foram jatobá (Hymenaea eriogyne), pau-d’óleo (Copaifera langsdorffii), ingá (Inga vera), pau-pombo (Tapirira guianensis) e bosta-de-cabra (Hirtella gracilipes).
As florestas estacionais deciduais, popularmente conhecidas como matas secas, apresentam como principal característica a perda de pelo menos 70% das folhas na estação seca. São formações florestais que ocorrem em afloramentos de calcário no cerrado e não estão associadas aos cursos d’água. Mas muitos fragmentos de mata seca estão presentes às margens do rio Pandeiros e apresentam como espécies vegetais mais representativas o angico (Anadenanthera colubrina), mamoninha (Dilodendron bipinnatum), aroeira (Myracrodruon urundeuva) e gonçalo-alves (Astronium fraxinifolium).
O cerrado é o tipo fisionômico, ou seja, a formação vegetacional dominante da Apa do rio Pandeiros e está intimamente associado à vegetação ciliar desse rio. São encontradas, freqüentemente próximas às margens do rio Pandeiros, as espécies arbóreas do cerrado conhecidas como pimenta-demacaco (Xylopia aromatica), lixeira (Curatella americana), cagaita (Eugenia dysenterica) e tingui (Magonia pubescens).
As veredas ocorrem em áreas úmidas do cerrado, locais onde o afloramento do lençol freático possibilita encharcamento do solo. Essas formações são caracterizadas pela presença da palmeira buriti. Em vários trechos do rio Pandeiros, registra-se a presença de extensas veredas associadas à vegetação ciliar, que atuam na manutenção dos seus afluentes e funcionam como refúgio para a fauna durante a estação seca.
A obtenção de informações e subsídios para conhecimento da biodiversidade numa área transicional, entre os biomas Cerrado e Caatinga, seu potencial biológico, e novas possibilidades de desenvolvimento de tecnologias de recuperação de áreas degradadas da vegetação ciliar da região do médio São Francisco é o foco das pesquisas em curso.
O Programa de Revitalização do rio São Francisco contempla grande conjunto de iniciativas para permitir o uso sustentável dos recursos naturais em toda a bacia. Para que o programa se sustente, no entanto, é necessário aumentar a base de conhecimento de todos os aspectos referentes à manutenção das funções dos ecossistemas que compõem a bacia. Dessa forma, os projetos, o conhecimento gerado e as ações previstas na sub-rede deverão encaminhar ações reais de desenvolvimento sustentado que promovam a melhoria da qualidade de vida das populações locais e assegurem a biodiversidade de uma área ainda desconhecida da ciência.

PARA CONHECER MAIS

Biodiversidade em Minas Gerais: um atlas para sua conservação. G. M. Drummond, C. S. Martins, A. B. M. Machado, F. A. Sebaio e Y. Antonini. Fundação Biodiversitas, 2005.
Vereda Berço das Águas. R. S. Boaventura, C. J. Soares, F. M. Vasconcelos e J. P. C. Castro. Ecodinâmica, 2007.

Franciely Pinheiro Azevedo, mestranda em ciências biológicas da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), é bolsista do CNPq.
Yule Roberta Ferreira Nunes, professora de ecologia da Unimontes, desenvolve pesquisas na área de ecologia de ecossistemas e recuperação de áreas degradadas.
Maria das Dores Magalhães Veloso, professora de ecologia da Unimontes, é doutoranda em engenharia florestal na Universidade Federal de Lavras.
Walter Viana Neves, técnico ambiental do Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais, atua na área de gerenciamento de unidades de conservação e de prevenção e combate a incêndios florestais.
G. Wilson Fernandes, professor de ecologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), desenvolve pesquisas na área de ecologia evolutiva de insetos herbívoros e conservação da biodiversidade tropical.

Fonte: Scientific American Brasil – http://www2.uol.com.br/sciam/

Recuperação de áreas degradadas no Rio São Francisco

D. Frei Luiz Flávio Cappio recebe Prêmio Cidadão do Mundo pela Fundação Kant

São Cidadãos do Mundo todos e todas que nos juntamos em defesa do São Francisco, terra e água, rio e povo


D. Luiz Cappio, em foto de arquivo

“São Cidadãos do Mundo todos e todas que nos juntamos em defesa do “São Francisco – terra e água, rio e povo”, afirma D. Frei Luiz Flávio Cappio, ofm, no discurso de agradecimento pelo Prêmio Cidadão do Mundo, da Fundação Kant. Segundo Cappio, “o atual governo, do Presidente Lula, frustrante das enormes expectativas da maioria que o elegeu, se presta a subsidiar a reprodução do modelo falido. O PAC, Programa de Aceleração do Crescimento (cerca de 178 bilhões de euros) prioriza obras de infraestrutura para o crescimento econômico a qualquer custo – até o desrespeito à lei, a povos tradicionais, a instituições do Estado”.

Eis o discurso.

Saúdo os membros da Fundacao Kant. Saúdo as autoridades presentes, especialmente o Vice-Ministro do Exterior Gernot Erler, pela “laudatio” que muito agradeco. Saúdo as senhoras e senhores presentes nesta festa magnífica, em especial a Jeff Hapter, que comigo recebe este premio. Saúdo os pobres do mundo sem vez e sem voz, que lutam por seu direitos humanos: comigo recebem este premio!

Quando me veio a notícia do Prêmio Cidadão do Mundo, da Fundação Kant, fiquei a me perguntar o por que. Que ligação teria a nossa luta no Vale do Rio São Francisco, no Nordeste do Brasil, com a filosofia de Immanuel Kant e os propósitos da Fundação que zela pelos seus ideais? Fui rever meus estudos de Filosofia, nos longínquos anos 1960. Não foi difícil perceber a intenção dos premiadores nas proposições ético-filosóficas de Kant, luminosamente atuais, de uma cidadania cosmopolítica, baseada nos direitos humanos universalizados, unidas a moral e a política.

Ser associado a esta filosofia me honra, mas não me ensoberbece. Porque o objeto da premiação não é uma pessoa ou o que por si mesma, solitariamente, ela tenha feito. Não é mérito de um, mas de uma legião de homens e mulheres, jovens e anciãos, movimentos, organizações e entidades sociais, que agem – poderíamos dizer – sob o imperativo categórico kantiano: buscar para todos o que desejaríamos que todos fizessem a todos.

Atitude que eu diria revolucionária, dada a extensão e profundidade da crise que vivemos, de civilização, de paradigma, no fundo, a mais grave crise ética. Não se pautar por princípios universais (porque os fundamentais), mas por fins meramente individualistas e utilitários, foi o que desumanizou o homem e o levou a corromper a natureza. Estamos sob o jugo de um inédito relativismo dos valores e referenciais da existência humana, uma perda coletiva do sentido da vida, da sociedade, da humanidade. Na verdade, sem exagero, não estamos longe de um estado de anomia e barbárie.

* * * * *

Como e por que chegamos a este ponto? – devemos ter a coragem de responder e não temer a resposta.
O Relatório do Desenvolvimento Humano 2007/2008, do PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento revela: os 20% mais ricos do mundo absorvem 82,4% de todas as riquezas do planeta enquanto os 20% mais pobres têm que se contentar com apenas 1,6% . Este máquina de produzir desigualdade não mais se sustenta politicamente, nem se aceita eticamente.

Está evidenciado que sua raiz está no sistema da economia de livre-mercado autoregulado e absoluto – o chamado neoliberalismo e sua globalização mercantil – erigido sobre o dogma do máximo lucro, extraído a qualquer custo, até da doença e da morte de milhões de seres humanos (como acontece na África com a SIDA, como ameaça acontecer com a Gripe A). Esta pretensão a-ética não se refreia frente à danação dos semelhantes. Mas, os limites da natureza, a exaustão dos recursos naturais e o aquecimento global causado por esta civilização, se encarregam de oferecer à humanidade uma chance, talvez a última, de rever este sistema de morte e reinstaurar relações livres e solidárias com todas as formas de vida. Como diz meu mestre e irmão Leonardo Boff, “a nova era ou será da ética ou não será”.

Esta a tarefa que esta premiação nos convoca. Se as alternativas históricas ao capitalismo mostraram-se frustrantes, reproduzindo a dominação humana e a depredação natural, trata-se de, aprendendo da experiência histórica, reinventar nosso modo de vida sobre a terra.

Acredito firmemente que uma sociedade internacional justa, sustentável e pacifica, que viva e deixe viver, só é possível numa perspectiva ecossocialista. A produção se tornando ecológica e o acesso aos bens necessários produzidos se fazendo solidário, sob condições socialistas, é o que nos levará à superação das crises atuais. Acredito que a Europa, apesar das contradições do colonialismo, pela tradição da democracia e dos direitos humanos, tem um papel importante nisto.

Acredito também que os povos originários, resistentes e sobreviventes à colonização, e as comunidades empobrecidas do Sul e de todo o mundo, têm enorme contribuição a dar. Pois nutrem o desejo da mudança e conservam práticas tradicionais de relação com a natureza e entre si com mais nítidas marcas de interação respeitosa e solidária.

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É por onde entendo e aceito o Prêmio Cidadão do Mundo, da Fundação Kant. Porque na minha pessoa vocês e eu vemos todos e todas que encarnamos esta utopia – ideal de vida e compromisso histórico. Concretamente, são Cidadãos do Mundo todos e todas que nos juntamos em defesa do “São Francisco – terra e água, rio e povo”, nos mobilizamos sobre um eixo de vida comum-unitária no pauperizado Semiárido brasileiro, nos dedicamos em resgatar a dignidade dos pobres exigindo com eles ativa e pacificamente a justiça e o direito, os mesmos que deveriam existir universalmente.

Busquei estes Cidadãos do Mundo na minha trajetória de vida nos últimos 40 anos, desde que atendendo ao chamado de Jesus no modo de vida proposto e testemunhado por Francisco de Assis, troquei o rico Sudeste do Brasil pelo empobrecido Nordeste. Encontrei-os nas comunidades e povos empobrecidos e resistentes dos sertões semiáridos do rio São Francisco.

Entendi que Cidadãos do Mundo aqui premiados são os pobres desta região, com quem tenho aprendido mais que ensinado a dignidade do trabalho, a alegria da partilha mesmo na maior carência, o cuidado com os dons da terra, das águas, das matas e dos animais, o direito às condições materiais e imateriais imprescindíveis a uma vida abundante e em paz. Por exemplo, os ribeirinhos lutadores pelo rio e por si mesmos – povo do rio – que encontramos entre 1993 e 1994 ao peregrinar por um ano pelas margens dos quase 3 mil km do terceiro maior rio do Brasil. Ou os habitantes do Semiárido que, apesar dos desmandos e corrupções, aprendem e ensinam a conviver com o clima, com as condições ambientais adversas.

Cidadãos do Mundo premiados pela Fundação Kant são também as incontáveis pessoas e entidades, muitas aqui na Alemanha, que se manifestaram solidárias aos movimentos de jejum e oração que fizemos, em 2005 e 2007, contra o Projeto de Transposição de águas do rio São Francisco. Entenderam nosso gesto: tal projeto sintetiza a falácia do sistema, pois em nome dos pobres sedentos pretende criar segurança hídrica para grandes empreendimentos privados de produção e exportação de produtos hidroitensivos e socialmente danosos, como a cana-de-açúcar para etanol.

Sempre me angustia a pergunta: por que temos que lutar contra, quando temos muito mais a favor para lutar? Mas, se é verdade que “um rio é como um espelho que reflete os valores de uma sociedade”, a nossa não vale o que bebe e come…

Resiste-se às evidências da falência deste modelo. No Brasil, com tantas dádivas da natureza, potencial extraordinário para servir a seu povo, à humanidade e ao planeta nesta hora grave, as crises econômica e ecológica têm sido encaradas até entusiasticamente como oportunidade de negócios lucrativos, numa postura cega, mesquinha e irresponsável. O atual governo, do Presidente Lula, frustrante das enormes expectativas da maioria que o elegeu, se presta a subsidiar a reprodução do modelo falido. O PAC, Programa de Aceleração do Crescimento (cerca de 178 bilhões de euros) prioriza obras de infraestrutura para o crescimento econômico a qualquer custo – até o desrespeito à lei, a povos tradicionais, a instituições do Estado.

No Brasil e em lugar nenhum, não cabe mais o crescimento ilimitado e obsessivo. É urgente mudar nosso modo de produção e nossos padrões de consumo, estabelecendo como critério a destinação universal dos bens necessários. Temos que aprender a “viver mais com menos”. Emergencialmente, ampliar iniciativas como a taxação de atividades destrutivas, do capital especulativo e dos grandes lucros, e o emprego destes recursos em programas de prevenção dos desastres ecológicos e apoio às vitimas da fome, da sede, das doenças e das mudanças climáticas.

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Por fim, compreendidas e compartilhadas as razões de estarmos aqui, só tenho a agradecer. Como reconhecimento e reforço de nossa luta, veio em boa hora. Muitos – porque não entendem e minimizam o que está em jogo – já davam por perdido o embate desigual que fazemos. Feliz coincidência: esta semana começamos uma nova Campanha Internacional contra a Transposição do Rio São Francisco, cujas obras estão iniciadas pelo Exército Brasileiro. Lançada pelos 33 Povos Indígenas da Bacia do São Francisco afetados direta e indiretamente, exige consulta a eles e ao Congresso Nacional e respeito aos seus territórios, como manda a Constituição. Convido aos senhores e senhoras a se engajarem nesta Campanha de emails ao Supremo Tribunal Federal e às demais autoridades brasileiras.

Agradeço à Fundação Kant a oportunidade de todo este avanço da consciência e da luta. Associá-la à luta do povo palestino, na pessoa de Jeff Harper, mais a engrandece e aprofunda. Comunico que vamos destinar o valor econômico do Prêmio ao início das obras do Santuário dos Mártires em minha diocese. Cidadãos do Mundo, mais do que ninguém, foram eles que deram a própria vida à causa da Vida. Em vida tiveram sofrimento e dor, que descansem com dignidade e paz!

Agradeço a todas as entidades e pessoas que têm se dedicado abnegadamente à solidariedade com a luta popular no Brasil, em especial aquelas que organizam essa nossa visita à Alemanha e Áustria: KOBRA (Kooperation Brasilein), Missão Central Franciscana, Misereor, Adveniat, Kindam…, Casa do Mundo e Paróquia do Anjo da Guarda, em Graz (Áustria).

Anterior a Kant e à sua entusiástica proposta de uma “paz perpétua”, fundada no exercício do Direito da “comunidade universal”, Francisco de Assis, pai e mestre, quase 800 anos antes das atuais catástrofes sócio-ambientais, propunha a fraternidade universal como o caminho para a salvação de todos e glória do Criador.

A todos e todas minha saudação franciscana, e que ela soe como uma oração: PAZ e BEM!

(Ecodebate, 13/05/2009) publicado pelo IHU On-line, 12/05/2009 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

O Rio São Francisco evapora

rio São Francisco

Estudo americano aponta um alarmante declínio de seu nível de água devido ao aquecimento causado pelo “El Niño”

“A água doce é um recurso vital e a tendência de queda é motivo de preocupação.” Foi com essa frase que um dos mais conceituados cientistas do mundo, o chinês Aiguo Daí, coordenador do estudo que reuniu especialistas americanos do National Center for Atmospheric Research (NCAR), anunciou os resultados da mais completa e extensa pesquisa sobre a redução do volume de 925 rios do planeta. Segundo o pesquisador Daí, o rio São Francisco, o nosso “Velho Chico”, é o que amargou o maior declínio nos últimos 50 anos em território brasileiro – 35% dele secou, o que o coloca ao lado da delicada situação de outros grandes rios, sobretudo nos EUA, África e Ásia. Saber que o São Francisco está evaporando é preocupante para o Brasil. Reportagem de Luciana Sgarbi, na Revista IstoÉ,Edição 2071.

Ele é, na verdade, um rio de integração nacional, traduzindo-se em uma espécie de “caminho natural” de ligação das regiões Sudeste e Centro-Oeste à região Nordeste. Desde as suas nascentes, na Serra da Canastra, em Minas Gerais, até a sua foz, na divisa entre Sergipe e Alagoas, ele percorre 2,7 mil quilômetros. Ao longo de sua “jornada”, banha cinco Estados: Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas. Apesar de receber água de 168 afluentes, o “Velho Chico”, descoberto em 1502, está sendo derrotado por um gigantesco fenômeno climático. Trata-se do “El Niño”, que aquece também as águas do Pacífico.

Os cientistas copilaram dados dos maiores rios do mundo abrangendo o longo período que se estende de 1948 a 2004 e concluíram que diversos deles, que atravessam algumas das regiões mais populosas, estão perdendo água. De acordo com os pesquisadores, o fluxo na bacia do Amazonas caiu 3,1%, enquanto outros rios brasileiros apresentaram números completamente opostos, até com elevação de nível na vazão.

No rio Paraná, por exemplo, houve um aumento da ordem de 60%. “Buscamos entender o caso do São Francisco, sobretudo porque a existência de resultados tão diferentes em um mesmo território não é comum”, diz Daí. “A variação está relacionada principalmente a mudanças na quantidade de chuvas nas regiões das bacias. Seguindo essa linha de raciocínio, torna-se impossível não pensarmos no El Niño.” Esse fenômeno meteorológico consiste em um aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico, afetando o clima do planeta em geral e, mais duramente, o de determinadas regiões específicas.

No estudo americano consta que durante o período em que o São Francisco foi analisado a região de sua bacia apresentou uma leve queda nos níveis de precipitações e um grande aumento de temperatura. “Esses dois fatores contribuíram para o grande declínio e escoamento do rio. É uma lei elementar da natureza: o aumento da temperatura eleva a evaporação e assim acaba reduzindo o fluxo da água”, diz o coordenador do projeto de análise do NCAR.

Na mesma situação de esvaziamento do São Francisco estão outros rios como o Amarelo, na China, o Niger, na África, e o Colorado, nos EUA – e todos abastecem áreas populosas. Um dos casos mais graves é justamente o do Colorado, que mesmo em anos de muita chuva já não consegue se recuperar enquanto deságua no Mar de Cortez. Ali o problema tem duas “nascentes”: a evaporação causada pelo “El Niño” e a transposição. O desvio das águas do Colorado para abastecer a agricultura acabou poluindo e desperdiçando grande parte do fluxo. Para revitalizá-lo, diversos projetos foram desenvolvidos com a finalidade de despoluí-lo e nele aumentar a biodiversidade aquática, que sofreu intensa alteração ambiental devido à construção de hidrelétricas. No Brasil, a transposição do rio São Francisco sempre tem gerado polêmica.

O projeto é da competência do governo federal, sob a responsabilidade do Ministério da Integração Nacional, e está orçado em aproximadamente R$ 4,5 bilhões. Serão dois canais totalizando 700 quilômetros de extensão e que, segundo o governo, estão destinados a assegurar oferta de água em 2025 a quase 12 milhões de habitantes de pequenas, médias e grandes cidades da região semiárida dos Estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.

As críticas sobre o projeto recaem no fato de ele ser uma obra cara e que abrange somente 5% do território e 0,3% da população do semiárido brasileiro. Finalmente, diversos ambientalistas ressaltam também que a transposição poderá afetar intensamente o ecossistema ao redor de todo o São Francisco. Sobre um ponto, no entanto, não resta dúvida: alguma providência tem de ser tomada sobre um rio vital na união de regiões do País e que já perdeu 35% de sua água.

[EcoDebate, 24/06/2009]

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Consciência Ecológica e Preservação Ambiental

Quando o Brasil sediou a ECO 92 – Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, os meios de comunicação se ocupavam muito pouco da questão ambiental e a consciência ecológica era privilégio de poucos e esclarecidos cidadãos. Essa conferência, que aconteceu no Rio de Janeiro, estabeleceu o conceito de "Desenvolvimento Sustentável", que não apenas focava sua temática no meio ambiente, mas também no estabelecimento de uma sociedade mais justa, solidária e pacífica.

A Carta da Terra

"Para se atingir uma visão compartilhada de valores básicos que proporcione um fundamento ético à comunidade mundial emergente, a Carta da Terra, formalizada durante o encontro, foi estruturada em quatro grandes princípios. Estes princípios são interdependentes e visam a um modo de vida sustentável como padrão comum. Espera-se que através deles a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais seja dirigida e avaliada.

Respeitar e cuidar da comunidade de vida

Assegurar a integridade ecológica

Comprometer-se com a justiça social e econômica

Democracia, não-violência e paz como princípios universais

A Carta é um documento relativamente breve e conciso, escrito com linguagem inspiradora. É a articulação de uma visão que reflete valores universais e uma declaração de princípios fundamentais com significado perdurável e que pode ser compartilhada amplamente pelos povos da todas as raças, culturas e religiões. É uma chamada para a acção, que agrega novas dimensões significativas de valores às que já se encontram expressas em outros documentos relevantes e, ainda, uma Carta dos povos que deve servir como um código universal de conduta para pessoas, para instituições e para Estados." (Fonte: Wikipédia)

A ECO 92 tornou-se um marco entre a sociedade de desperdícios e consumismo e uma nova era que começa a se tornar realidade a partir desses princípios. Hoje, as ações que se desenvolvem em todas as esferas de poder e, principalmente, através de organizações não-governamentais, nos permite acreditar em um mundo mais justo, mais digno, mais pacífico e viável!

No entanto, em nosso país continental, os desequilíbrios culturais, econômicos, sociais e políticos favorecem a manutenção de situações insustentáveis para o meio ambiente. Na Amazônia, os interesses de madeireiros, mineradoras, latifundiários e de coronéis da política sobrepujam o bom senso e a honestidade de princípios, e ameaçam destruir o mais completo e diversificado ecossistema do planeta. Na zona costeira, a Mata Atlântica representa, hoje, menos de 7% do que foi na época do Descobrimento, e continua sendo ameaçada por mineradoras e latifundiários, mesmo em estados desenvolvidos como São Paulo, Minas Gerais e Paraná.

Em todo o país, nosso patrimônio espeleológico está ameaçado pela própria ação governamental que, pressionada pelas mineradoras, é tentada a liberar cavernas de inestimável valor científico, histórico, cultural e turístico para a extração de calcário, alumínio e outros minerais.

Os recursos hídricos de nosso país não têm paralelo em qualquer outra região da Terra; possuímos as maiores bacias hidrográficas do mundo, o maior aquífero subterrâneo, os maiores reservatórios artificiais. No entanto, nossas bacias hidrográficas sofrem agressões de toda espécie: esgotos das cidades, resíduos industriais, agrotóxicos...

A estratégia de longo prazo para todos esses males é a conscientização de toda uma geração que será herdeira de nosso planeta para que façam o que não fomos capazes de fazer: conter a destruição ambiental, mudar hábitos de consumo e preservar a Natureza. Como implementá-la? Através da educação ambiental em todos os níveis de ensino, o compromisso formal com o meio ambiente, a responsabilização civil e criminal por todas as agressões à Natureza. Se nossa geração perdeu a oportunidade de reverter esse quadro, ainda temos tempo para transformar os nossos descendentes e fazer deles cidadãos responsáveis e compromissados com o futuro da Humanidade!

domingo, 2 de agosto de 2009

Represamento do São Francisco: ponderações

Na antiguidade, o que assegurou a prosperidade do povo egípcio foram as cheias do rio Nilo; quando transbordava, levava, com suas águas, a fertilidade aos solos inundados; quando o rio voltava ao seu curso, a agricultura se desenvolvia nessas terras e garantia a alimentação desse povo, cuja civilização prosperou por mais de um milênio.

O São Francisco era assim: nas cheias, formava lagoas onde peixes e pássaros se reproduziam e cresciam protegidos dos predadores. Quando as águas escoavam de volta ao seu leito, levava consigo a vida renovada e deixava para trás terras férteis e produtivas. As represas reduziram drasticamente essa função fertilizadora do rio.
Mas não foram apenas essas as consequências do represamento. Muitas espécies de peixes se reproduzem depois de subir o rio em direção à nascente, fenômeno conhecido como "piracema". Com a construção das represas, essas espécies não tinham como migrar e, aos poucos, foram desaparecendo do Velho Chico.
E houve outra consequência para a vida no rio: as represas funcionam como desaceleradora da correnteza; o rio reduz sua velocidade e, com isso, os detritos e a terra arrastada das margens, aos poucos se sedimentam no fundo, tornando a água límpida e azul. Parece bom, mas não é. Muitos peixes, como o dourado, precisam da correnteza para caçar. Outros dependem da água turva para surpreender suas presas. Nas águas lentas e límpidas das represas esses peixes tendem a desaparecer ou crescem menos, por não conseguirem se alimentar suficientemente.
Quando falamos em revitalização do São Francisco precisamos equacionar soluções para esses problemas: criar condições de reprodução das espécies desaparecidas ou ameaçadas de extinção, construir escadas próximas ao vertedouro das represas para permitir a piracema, estimular a criação de peixes em açudes próximos às margens para repovoamento das espécies ameaçadas, e proteger as lagoas remanescentes para que continuem sua função de berçários naturais para pássaros, peixes, répteis e mamíferos.
Mais um efeito do represamento: a grande área exposta pela lâmina dágua das represas favorece a evaporação; estima-se que 75% da evaporação do rio ocorre nas represas. É claro que uma parte dessa água retorna ao rio com as chuvas; no entanto, a evaporação é muito maior no período das secas.
Quanto ao assoreamento das represas haverá que se estudar alternativas economicamente viáveis para evitar que sua capacidade de armazenamento chegue a níveis em que a recuperação se torne onerosa demais para ser realizada. O custo ecológico da construção das represas pode ser, em parte, recompensado pelos benefícios sociais da regularização do ciclo das águas e da produção de energia elétrica, mas a sobrevivência do rio, evidentemente, é prioritária. Portanto, quando se pensa em um projeto de revitalização da bacia do São Francisco, há que se considerar os impactos dos reservatórios artificiais construidos em seu percurso, e em soluções específicas para esses ecossistemas confinados.

sábado, 1 de agosto de 2009

Reflorestamento de nascentes, margens e áreas degradadas

O reflorestamento de nascentes, margens e áreas degradadas, bem como a recuperação e controle de processos erosivos na bacia enquadram-se no tipo de ação considerada estratégica para a revitalização, sendo a degradação da vegetação e os processos erosivos já instalados um problema crônico que repercute negativamente, de diversas maneiras, na qualidade dos recursos hídricos.

Foram implantados viveiros de referência nas sub-bacias para produção de 1,5 milhão/ano; recuperação ambiental de projetos de assentamentos ; plano de desenvolvimento florestal da bacia; Recuperação da Cobertura Vegetal de Nascentes BHSF

Os projetos de reflorestamento de nascentes, margens na região do Submédio São Francisco, garantiram na Bacia dos rios Pontal, Brígida e Pajeú em Pernambuco a recuperação de cerca de 370 há.

Assim, estudos e projetos que se destinam à recuperação de áreas já degradadas ou que tenham caráter preventivo para a conservação e preservação de áreas não degradadas, também integram a lista das ações do Ministério da Integração Nacional/CODEVASF, em parceria com diversas instituições.

Podem ser citados o convênio com o Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais para reflorestamento de margens e áreas degradadas na região norte do Estado, os convênios com a Universidade Estadual da Bahia e Embrapa/Funder para a recuperação da cobertura vegetal de nascentes da região do Submédio São Francisco.

Projetos de reflorestamento de matas ciliares em assentamentos de reforma agrária, ao longo de toda a bacia, o Plano de Desenvolvimento Florestal da Bacia, para Minas Gerais e Bahia, e o apoio ao Programa Nacional de Florestas, foram alocados na recomposição da cobertura vegetal, aí incluídas parcelas destinadas à constituição de viveiros de mudas nativas em cinco regiões da Bahia.

Estudos de Viabilidade de implantação de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e Estudo sobre acesso ao Mercado de Carbono - O emergente mercado de carbono representa um dos mais disputados contextos no qual o pagamento por serviços ambientais está sendo debatido. A oferta de projetos de carbono no setor florestal visam reduzir emissões globais de gases de efeito estufa, mediante a troca de créditos, negociadas através de bolsa de valores.

Este estudo beneficiará todos os empreendimentos que comprovadamente conseguem demonstrar através de suas práticas metodológicas diminuir efeitos de gás estufa. Além do setor florestal poder se beneficiar, os projetos na área de tratamento de resíduos sólidos e de alternativa de energia limpa, como de matriz eólica (conforme o Parque Eólico no Submédio proposto para 2006) e de produção de biocombustíveis, podem se beneficiar destes estudos.

Além desses projetos, há também repasse para os editais do Fundo Nacional do Meio Ambiente que se destina à proteção e recuperação de nascentes e margens degradadas. As obras de contenção do Dique Cotinguiba/Pindoba, em Sergipe, é outra importante ação em curso incidente junto às margens do rio na região do Baixo São Francisco. Tal região também foi contemplada com projetos de revitalização de pequenas várzeas, em convênio com a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas.

O Projeto Demonstrativo de Gestão e Recuperação de Áreas Degradas pela Mineração, que mescla os temas recuperação de áreas degradadas, conservação do solo e monitoramento ambiental, foram alocados.

Fonte: Ministério da Integração Regional - Projeto de Revitalização da Bacia do São Francisco

Estudo revela diversidade da fauna da bacia do rio São Francisco

A diversidade de animais que compõem a fauna da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco foi apresentada na quarta-feira (4/10/06), em Brasília, durante as comemorações do dia do Rio São Francisco. A Coordenação Geral de Fauna do Ibama, que executa o trabalho, mostrou os resultados do levantamento de fauna silvestre feito no primeiro semestre de 2006. O estudo visa mapear e estudar as espécies e identificar as que estão criticamente ameaçadas de extinção, o que dará suporte às ações estruturantes para a conservação da biodiversidade da bacia.

Segundo a assessora técnica da Secretaria Executiva do Ministério do Meio Ambiente, Marcia Rodrigues, esta é a primeira vez que é feito um diagnóstico geral da fauna de uma bacia hidrográfica. "A bacia do São Francisco tem uma importância nacional, uma vez que abrange quatro biomas. Por isso, as ações estão sendo feitas de forma integrada e auxiliada pelos mapas das áreas prioritárias para conservação", destaca.

Esta é a primeira fase das análises que tem duração de dois anos e previsão orçamentária de cerca de R$ 2 milhões. Os grupos estudados foram: predadores naturais, com ênfase em carnívoros; primatas brasileiros; répteis e anfíbios; aves silvestres.

Para os estudiosos, um dos resultados mais preocupantes é que, aparentemente, a onça pintada está extinta na região da Foz do Rio São Francisco. Por outro lado, a região do futuro Parque Nacional do Boqueirão da Onça (BA) abriga uma população de onça pintada. Os pesquisadores acreditam que o estabelecimento de uma rede de Unidades de Conservação na região poderá garantir a preservação de uma população mínima viável no bioma Caatinga. A principal ameaça à população de mamíferos da ordem Carnívora é a fragmentação e destruição de hábitats.

Com relação aos primatas, foi descoberto o menor fragmento, e único para a Bacia do São Francisco, com ocorrência conjunta de grupos de guigó (C.coimbrai) e de macaco-prego-do-peito-amarelo (C. xanthosternos), ambos considerados criticamente em perigo de extinção. Também foi localizada uma população de C. xanthosternos em manguezais junto à foz, que está sob risco extremo devido ao contínuo avanço do mar sobre o continente, e que deverá ser monitorada.

Na análise dos répteis foram identificados acréscimos de novos registros de duas espécies de crocodilianos citadas para a bacia, o jacaré-do-papo-amarelo (Caiman latirostris) e o jacaré-ferro (Paleosuchus palpebrosus). O trabalho possibilitou prever a saúde dessas populações e seu potencial de uso como forma de alternativa de renda para as comunidades ribeirinhas do São Francisco. Para isso, o estudo recomenda a conservação das lagoas marginais do Rio São Francisco que são utilizadas como locais de abrigo, reprodução, berçário e alimentação das espécies.

Por fim, as aves da Caatinga. O bioma é um importante centro de endemismos de aves na América do Sul embora o conhecimento ainda seja reduzido. Os levantamentos preliminares mostraram que a região abriga importantes populações de marrecas, sendo inclusive a área onde existe a maior concentração no país da marreca viuvinha (Netta erythrophtalma). Ainda foi verificada a ocorrência de 145 espécies de aves, pertencentes a 43 famílias. Dessas, oito espécies são exclusivas do bioma Caatinga, três são consideradas mundialmente como quase ameaçadas de extinção e três consideradas de alta sensibilidade a distúrbios humanos.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Proteção dos Barrancos


Entre Vargem Bonita, onde comecei minha viagem, e a entrada da represa de Três Marias, onde ela foi interrompida, um dos fenômenos mais significativos e lamentáveis que constatei foi a quantidade de árvores arrastadas pela correnteza na época das cheias, e os barrancos desabados, levando o solo fértil rio abaixo, e provocando o assoreamento do rio, pelo caminho, e do lago de Três Marias.
Como minimizar esse problema, já que não há solução definitiva para ele? Uma das razões da destruição dos barrancos e das árvores é o desmatamento, a destruição das matas ciliares. O limite legal, de 50 metros das margens do rio, não é respeitado, nem é realista, uma vez que, nas cheias, o rio se estende por áreas muito maiores!
Além disso, as pastagens que substituiram as matas se estendem até a margem do rio; o pisoteamento do solo pelo gado transforma as praias naturais em barreiros e lamaçais perigosos até mesmo para o gado que lá bebe água.

Eu presenciei uma situação lastimável: uma vaca holandesa rastreada, atolada à beira do rio, já sem forças para se safar da lama, e que não consegui salvar.
Mas grande parte dos barrancos desaba mesmo sem a intervenção predatória do homem, pela força e volume das águas nas cheias do rio. Presenciei milhares de árvores caídas ao longo do rio, algumas obstruindo quase completamente o leito, dificultando a navegação.
Além disso, as pilastras das pontes ficam cercadas de enorme quantidade de galhos e de lama, reduzindo a área de vazão do rio.
Todos esses problemas podem ser mitigados pela recuperação da mata ciliar e da cobertura vegetal dos barrancos com espécies de gramíneas resistentes à ação das águas. Os limites das matas ciliares precisam ser reavaliados, não se restringindo rigorosamente a números, mas à sua função protetora dos barrancos e da foz dos afluentes.
Também o tipo de ocupação do solo pela ação do homem precisa ser repensado em função dos impactos ambientais que causa. Permitir que o gado invada os rios para beber água, além de ferir os critérios legais, também é uma irresponsabilidade, não apenas pelas fezes que são jogadas no rio, mas principalmente pela produção de lama e enfraquecimento das margens, que acabam levadas pelas águas.
Mais uma vez, a conscientização da população ribeirinha e, em especial, dos agricultores e pecuaristas, será decisiva para perenizar ações efetivas de revitalização da bacia do São Francisco.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Propostas para a revitalização do São Francisco

Sustentabilidade é a "palavra da moda" entre executivos e políticos; até mesmo entre ambientalistas que se confortam com a "destruição controlada!". No entanto, quase todas as reservas naturais estão ameaçadas pela expansão das fronteiras agrícolas e extrativistas. A soja, a cana de açúcar, a pecuária e a mineração são os inimigos viscerais do meio ambiente! Portanto, antes de se estabelecer "economias sustentáveis" em áreas de preservação ambiental, deveria ser feito um inventário dos recursos naturais ameaçados!

Penso em quais providências deveriam ser tomadas para a revitalização do São Francisco. Embora não seja um especialista no assunto, tenho minhas próprias concepções. Não é difícil imaginar alternativas quando se compreende o problema e se está comprometido com a Natureza.

A primeira ação que me ocorre é realizar um inventário atualizado e extensivo dos recursos hídricos e dos remanescentes de matas ciliares do Alto São Francisco, bem como o uso atual do solo, registrando a incidência de contaminação por esgotos domésticos, resíduos industriais e agrotóxicos.

Tendo uma visão correta das reservas hídricas e das fontes poluidoras, o próximo passo seria proteger essas áreas remanescentes através da extensão dos limites do “PARNA Serra da Canastra” até a confluência com o rio Samburá, incluindo sua nascente. Poderia ser denominado “Parque Nacional Nascentes do São Francisco”.

Com base nos levantamentos aerofotogramétricos, deveria ser desenvolvido um sistema geo-referenciado para monitorar, através de sensoriamento remoto e integrações cadastrais, a preservação das áreas protegidas. Esse modelo poderia até ser adotado para todos os parques nacionais.

Minha visão sobre parques nacionais inclui o entendimento das bacias hidrográficas como áreas de preservação integrais, e não segmentadas, como ocorre hoje. Assim, proponho a criação de uma Área de Preservação Ambiental que contemple toda a bacia do São Francisco, seus principais afluentes, suas matas e sua fauna. É importante compreender que o que sustenta os ecossistemas são seus recursos hídricos e não o contrário. As matas só existem devido às águas que possui em seus domínios...

Para assegurar a recuperação das áreas degradadas deveriam ser criados incentivos fiscais de compensação tributária para os proprietários (agricultores, pecuaristas, industriais) que investissem seus próprios recursos na recuperação, preservação e manutenção das reservas naturais: águas, terras, matas, cavernas e animais silvestres.

É de fundamental importância assegurar que a população tenha consciência de seu papel e responsabilidade na preservação do meio ambiente. Para isso, deveriam ser desenvolvidos programas de educação ambiental vinculados à realidade regional, em todos os segmentos sociais, nas escolas públicas e privadas, associações comunitárias e órgãos da administração municipal.

Aos infratores a Justiça deve estar preparada com os instrumentos adequados à imposição de penalidades, desde multas expressivas e convincentes até punições mais rigorosas, que coibissem os abusos e a degradação, o que se faria através da revisão do Código Penal nos artigos que tratam de crimes ambientais, tornando mais rígidas e severas as penas impostas aos que causem, intencionalmente, danos ao meio ambiente nas áreas protegidas.

Em contraposição, àqueles que contribuem para a conservação da Natureza, pessoas físicas ou empresas, entidades não governamentais e associações comunitárias, deveriam ser instituídos prêmios de incentivo e benefícios fiscais.

Também deveriam se tornar criminalmente imputáveis as ações políticas que favoreçam o descumprimento e o desrespeito às leis ambientais nas áreas de preservação. Sabemos que o tráfico de influência funciona de forma deletéria, principalmente em organismos responsáveis pela fiscalização e pela liberação de atividades nas áreas de preservação. Atenção especial às madeireiras e mineradoras, aos pecuaristas e agricultores latifundiários, cuja ambição e ganância não tem limites.

Por fim, é necessário e urgente estimular a criação de RPPN´s – Reservas Privadas de Preservação Ambiental, através de compensações fiscais e outros mecanismos legais, de modo a comprometer empresas e grandes propriedades rurais com os esforços de recuperação e preservação da bacia do São Francisco.

Em resumo, as ações que julgamos essenciais para a revitalização do Velho Chico:

-Proteção dos barrancos para reduzir os impactos das cheias e o assoreamento

-Criação de escadas para piracema nas represas

-Criação de viveiros de mudas para recuperação das matas ciliares

-Criaçao de viveiros de pássaros e peixes para repovoamento dos rios e lagoas

-Proteção das espécies ameaçadas de extinção

-Tratamento dos esgotos urbanos, agrícolas e industriais antes de serem lançados ao rio

-Campanhas permanentes de conscientização ecológica das populações ribeirinhas

-Criação do Parque Nacional Nascentes do São Francisco (extensão do PARNA Canastra)

-Proteção das lagoas de reprodução de animais silvestres nas margens do São Francisco

-Prêmios de incentivo à preservação ambiental para empresas e agro-indústria

-Punição mais rigorosa de crimes ambientais

-Criação de novas APA (Áreas de Preservação Ambiental) e RPPN (Reservas Particulares do -Patrimônio Natural)

-Redução e controle do uso de agrotóxicos nas lavouras

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Lições da Natureza

Quando olhei o rio pela primeira vez pareceu-me estranho e arredio, como se não quizesse minha presença ali. Eu compreendi suas razões, pois aquele não era o meu mundo. Estava ali de passagem, como tantos outros... uns poucos o trataram com respeito e admiração, mas a maioria só estivera ali para levar seus filhos, os peixes, as capivaras, as matas... e nada deixaram em troca!

Aceitei a recusa do rio com humildade e respeito e, a cada novo dia, ele me parecia mais tolerante, compreensivo. Seus filhos já me reconheciam e aceitavam a minha presença; suas águas contavam-me seus segredos; e, aos poucos, fui aprendendo sua linguagem e compreendendo seus mistérios.
Olhava as águas e elas me diziam se havia troncos submersos, se redemoinhos se formavam em seu leito, se uma nova corredeira estava por surgir à minha frente... os pássaros também me falavam sobre seus ninhos, que eles protegiam com determinação; mostravam-me o melhor caminho em uma corredeira; afastavam-me dos perigos.
Assim, fui me afeiçoando ao rio e à sua gente... ao entardecer, quando me preparava para o pernoite, olhava ao meu redor e sabia que não havia perigo em estar ali, cercado de personagens fantásticos em seus mundos individuais. Montava a minha barraca, apreciava os últimos raios de sol, ouvia as melodias de seus animais ocultos pela mata... e adormecia feliz...
Todas as manhãs os pássaros me despertavam antes mesmo do primeiro raio de sol. Ficava ali, deitado, apreciando as vozes de diferentes aves, a recitar seus poemas à vida, à eterna certeza do vir a ser, renovando minhas convicções...
Durante o dia remava tranquilo, horas a fio, pois estava cercado desses seres extraordinários, que se afeiçoaram a mim, como eu a eles. Nada dizíamos uns aos outros, mas estávamos lá, convivendo e compartilhando nossas existências...
Poderia ter ficado ali para sempre, não fora a presença de outros seres humanos, que me contaminaram de suas idéias equivocadas, alertando-me para os perigos... não que eles não existissem, mas eram esses os meus desafios, minha sentença de vida, superação e coragem. Fui envenenado por essas opiniões... e parei... agora estou aqui, desconsolado e só...

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